sexta-feira, 6 de junho de 2014

118. Imagem e democracia

Quantas vezes podem, ou devem, o presidente da câmara e o seu vice aparecer nos jornais? A pergunta, feita assim, parece ter uma resposta estupidamente óbvia, pois os referidos senhores aparecerão as vezes todas que quiserem, ou que lhes seja dado aparecerem pelos meios de comunicação social locais.
A questão de fundo é outra, ou melhor, são outras, designadamente estas:
1- O que recomendam as boas práticas da profissão jornalística e a independência dos órgãos de comunicação social? Qual o critério de razoabilidade que deve ser seguido, compatível com a credibilidade dos meios e a sensibilidade das audiências?
2- O que recomendam os bons princípios democráticos, assentes em elevados padrões ético-morais, e a manutenção de um clima saudável de justiça, cidadania e igualdade de oportunidades? Como se devem posicionar os meios de comunicação social num contexto de verdadeira democracia, diferentemente de um contexto de caciquismo, amiguismo e tráfico de influências?
O nível de desenvolvimento democrático de uma sociedade ou comunidade, também pode ser medido pelo equilíbrio ou desequilíbrio da exposição dos diferentes agentes políticos, sejam eles organizações ou personalidades. A própria medição, a existir, bem como a divulgação dos respectivos resultados, são já um indicador da qualidade do ambiente democrático vivido.
Tem-se vindo a assistir, desde as últimas eleições autárquicas, a uma crescente exposição mediática do novo edil e sua corte, uma tendência que é tudo menos fortuita ou inocente. E nem é preciso que a iniciativa seja da personalidade em causa, pois um certo localismo e provincianismo, as múltiplas afinidades e cumplicidades, as dificuldades financeiras que enfrentam os mídia locais e a useira e vezeira troca de favores pessoais, tratam de facilitar e promover essa sobreexposição, na expectativa de se poder vir a beneficiar das boas graças da entidade favorecida.
A democracia local tem ainda um longo caminho a percorrer para se fazer forte e exemplar, sendo responsabilidade primeira dos líderes políticos locais, dinamizar e estimular as boas práticas democráticas e de cidadania participativa. A comunicação social, por alguns chamada de 4º poder (há quem diga que é o 1º), tem também uma elevada responsabilidade e um forte exemplo a dar nesta matéria, sob pena de perder a dignidade e mergulhar numa perigosa promiscuidade.
As regras democráticas mandam que haja igualdade de oportunidades para todas as sensibilidades ideológicas e sociais, sabendo-se que a imagem e o espaço mediático que as mesmas ocupam são decisivos para a notoriedade e popularidade que alcançam junto da opinião pública. O poder que democraticamente se conquista por via de eleições, deve ser entendido como um meio de servir a comunidade e não como um estatuto ou feudo para instrumentalizar e abusar.
Mas, aquilo a que se está a assistir na exposição mediática do poder incumbente, não parece ser democraticamente saudável nem merecedor de apreço ou tolerância. Seria bom que houvesse mais respeito, pudor e comedimento, evitando a exagerada e, por vezes até, despropositada promoção da imagem pessoal, chegando a parecer, ora um certo "culto da personalidade", ora um "emplastramento" dos senhores do poder a tudo o que é mérito de outros, apenas para aparecerem na fotografia.



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