sábado, 30 de maio de 2015

173. Ontem já era tarde

Caldas da Rainha foi centro da vilegiatura em Portugal, até perder esse estatuto para as praias algarvias. O seu desenvolvimento e sustentabilidade sempre assentaram nos milhares de visitantes que regularmente a demandavam, seja como destino termal, de férias e passeio, seja como capital regional de serviços e negócios. As transformações operadas nas infra-estruturas e tecnologias, bem como nos valores e estilos de vida, criaram novas dinâmicas no país e na região, as quais originaram a redução do fluxo de visitantes a Caldas da Rainha, sem que os responsáveis políticos mostrassem capacidade para contrariar essa tendência. Pior, deixaram (e continuam a deixar) o património degradar-se continuamente, descurando um legado de excepcional valor.
Perante esta realidade, seria lógico que o município se mobilizasse para aumentar a capacidade de atracção de visitantes e turistas, bem como de novos residentes. Era uma questão de sobrevivência, tendo em conta a enorme oferta comercial e de serviços, claramente excedentária para as necessidades e capacidade de consumo dos seus habitantes. Vários concelhos vizinhos o fizeram, mesmo não tendo a carga de responsabilidade que Caldas tinha. Óbidos, por exemplo, apesar de não possuir os extraordinários recursos que Caldas possui, foi capaz de aumentar espectacularmente a sua capacidade de atracção turística, criando um modelo bem estruturado de eventos em torno do glamoroso conjunto vila-castelo. E Caldas da Rainha, o que fez? A resposta pode encontrar-se neste gráfico do Programa Territorial de Desenvolvimento do Oeste 2008-2013, publicado pela OesteCIM (ex-AMO):


Se, à entrada do milénio, o dramático atraso de Caldas da Rainha era este, o que mostram os números uma década depois? Basicamente que o município continua a atrair poucos turistas – tendo até diminuído o número de dormidas por habitante – e que melhorou um pouco a capacidade de alojamento oferecida, apesar desta se manter menos dinâmica do que a média da Região. Assim, por exemplo, enquanto Óbidos registou, entre 2009 e 2013, taxas de crescimento de alojamento (por mil habitantes) e dormidas (por cem habitantes) de 62% e 64%, respectivamente, Caldas da Rainha não conseguiu crescer mais de 22% na capacidade de alojamento e decresceu 2% no número de dormidas.
Sem prejuízo das responsabilidades próprias dos operadores turísticos, cabe à autarquia fazer a sua parte e criar condições favoráveis ao desenvolvimento deste estratégico sector, definindo uma política coerente, sustentada e adaptada à realidade de cada freguesia urbana, marítima e rural. Entre essas condições, salientam-se a conservação e requalificação do espaço público, a valorização e promoção do património natural e edificado, e a criação de um modelo integrado de grandes, médios e pequenos eventos, com suficiente poder de atracção dos públicos da região, das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, e até de outros países (p.e. das cidades geminadas).
Caldas da Rainha precisa de mais ambição e inovação no Turismo, apostando em algumas grandes realizações anuais ou bienais, organizadas em parceria pela autarquia e pelos agentes do comércio e da cultura, celebrando Bordalo e a Cerâmica, a Mulher e a Saúde, a Fertilidade e a Paródia caldense. São também de apoiar alguns eventos que têm dignificado a cidade e atraído visitantes (poderiam e deveriam atrair muitos mais), como o Festival do Cavalo Lusitano do Oeste, o Campeonato Europeu de Veteranos em Badminton ou o Campeonato Nacional de Dança Desportiva. Com mais visão e empenho da autarquia, liderando iniciativas credíveis e estruturantes, e comunicando com maior profissionalismo, a comunidade empreendedora sentir-se-á mais confiante para avançar com projectos turísticos de maior alcance, recuperando para o município os visitantes que este perdeu e de que necessita para se desenvolver.

José Rafael Nascimento
jn.correio@gmail.com

(Publicado na Gazeta das Caldas de 25 de Abril de 2015)

Sem comentários:

Enviar um comentário