sábado, 30 de maio de 2015

172. Separados à nascença

Caldas da Rainha tem irmãos gémeos, mas não sabe quem são. Há cerca de um ano, o executivo camarário decidiu “efectuar um levantamento das cidades geminadas com o município” mas, quando questionado recentemente sobre o assunto na Assembleia Municipal, optou por não responder. O portal do município indica que Caldas da Rainha está geminada com as cidades de Poços de Caldas (Brasil) e Huambo (Angola) desde 2001 e 2007, respectivamente, tencionando geminar-se com Raincy (França), Coria e Badajoz (Espanha), Ribeira Grande (Cabo Verde), Cambo-les-Bains (França), Dinant (Bélgica), Perth Amboy (EUA) e Lubango (Angola), mas a página online da DGAA (actual DGAL) informa que, em 2001, Caldas da Rainha estaria já geminada com a maioria destas cidades.
Entretanto, actas recentes da Câmara dão conta da geminação de Caldas da Rainha com as cidades de Figueiró dos Vinhos (Portugal) em 2013 e de Jonava (Lituânia) em 2014. Por sua vez, a imprensa local revela que o anterior edil esteve em Beberibe (Brasil) em Junho de 2008, a tratar do "intercâmbio e possível geminação" de Caldas da Rainha com aquela cidade do Ceará, e que a autarquia celebrou também um acordo de parceria - "na altura denominado de geminação" - com La Codosera (Espanha). Contudo, em Outubro de 2014, o actual presidente da Câmara afirmava à Gazeta das Caldas que o acordo firmado com Figueiró dos Vinhos era apenas uma “parceria” e que “lhe parecia que só com os mais antigos foram mesmo feitos acordos de geminação”. Não há palavras moderadas para qualificar tão notável confusão.
Além de não se saber ao certo com que cidades foram assinados protocolos de geminação, ignoram-se também as suas finalidades, iniciativas e resultados, com excepção do caso de Huambo em que, apesar da escassa informação, se sabe que em 2007 foi aprovada uma contribuição de cinquenta mil euros para a construção de uma escola primária naquele município angolano. Oito anos passados, que acções foram desenvolvidas e com que benefícios para ambas as cidades, “nos domínios da cultura e arte, educação, ciência e tecnologia”? Também o protocolo firmado com Figueiró dos Vinhos prevê a “criação da Rota de Malhoa” e o estreitamento das relações entre os dois municípios, “principalmente a nível cultural”. Que passos foram já dados nesse sentido? Porque não são os munícipes informados sobre esta e outras matérias?
No mundo globalizado em que vivemos, a interacção tornou-se mais importante que a localização. Para a socióloga Beatriz Xavier, “a cooperação intermunicipal, nomeadamente através de programas de geminação, surge às cidades como um espaço de apoio e fortalecimento”, pois “as cidades não são pontos isolados mas actores transnacionais, sendo o seu envolvimento e interacção com outros locais e agentes um elemento de crescente importância no universo da concorrência intercidades”. A nível europeu, por exemplo, o programa “Europa para os cidadãos” (2014-2020), apoia “as parcerias entre cidades (geminações)”, constituindo estas “um bom exemplo de como os cidadãos podem aprender uns com os outros, respeitar-se mutuamente e desenvolver projectos locais em conjunto”.
Assisti, recentemente, ao lançamento das bases de uma futura geminação entre a Golegã e a vila moçambicana de Boane, a qual privilegiará a vertente económica e empresarial nos sectores agrícola e agro-alimentar, havendo já investimentos em curso. Não consegui deixar de pensar como Caldas da Rainha vai perdendo, inexoravelmente, oportunidades como esta, pouco fazendo pela sua economia local. Há muito que os caldenses poderiam (e deveriam) estar a obter vantagens da geminação com outras cidades, com todos os benefícios culturais, económicos e sociais decorrentes. Mas não estão, o que é uma pena. Seria importante que a autarquia explicasse o que tem andado a fazer nesta matéria, que iniciativas tenciona levar a cabo e que proveito espera tirar dos protocolos firmados e a firmar.
José Rafael Nascimento
jn.correio@gmail.com

(Publicado na Gazeta das Caldas de 03 de Abril de 2015)

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