A
propósito de uma recente conferência local sobre “Ética na Política”, julgo que
vale a pena reflectir sobre o tema, não sem antes manifestar o desejo de que a
referida conferência tenha sido proveitosa e possa produzir melhorias substanciais
na qualidade da vida democrática do município. Afinal, é para mudar e
desenvolver que o conhecimento deve servir. Gostei, especialmente, das
referências feitas à necessidade de haver maior “transparência, zelo e
moralidade”, de se “colocar o interesse colectivo acima dos interesses
individuais e partidários” e de se “prestar contas e erradicar a corrupção, a
mentira e a promiscuidade entre o interesse público e as vantagens
particulares”. O conferencista reconheceu, segundo a imprensa, que hoje “as
pessoas não acreditam nos partidos políticos” e que “a vida pública deverá
voltar-se para a prática da cidadania, pois esta não se esgota na vida dos
partidos”. Partindo destes pressupostos e acreditando que o orador não se
estava a referir apenas ao proverbial “mal dos outros”, questiono-me se serão aqueles
valores compatíveis com um poder hegemónico de tipo oligárquico que tende
frequentemente a confundir o que ao Partido (que é de alguns) e ao Estado (que
é de todos) diz respeito, ou seja, se pode um poder com sólidos valores éticos comportar-se
como se fosse “o dono disto tudo”, preocupando-se mais em fazer “oposição à
oposição” e defender a teia de privilégios, do que em assumir as elevadas responsabilidades
para que foi eleito.
Como
atrás se recordou, o património público é propriedade de todos e o seu
benefício a todos pertence, exigindo-se respeito e rigor na aplicação de critérios
equitativos e justos na sua repartição. Do ponto de vista ético (com ou sem
tradução no texto legal), importa garantir que a escolha de fornecedores, a aquisição
de bens e serviços, a atribuição de subsídios, a avaliação dos júris de
concursos, a concessão de equipamentos municipais e a admissão de estagiários e
funcionários, é isenta, baseada no mérito e feita com total probidade e
transparência. O “Plano Municipal de Gestão de Riscos de Corrupção e Infracções
Conexas” pretende dar força legal a princípios éticos fundamentais que todos os
dirigentes autárquicos deveriam ter plenamente interiorizados e sempre
conscientes (o tal “eticómetro” de que falou o conferencista). Como está este
Plano realmente a ser cumprido e auditado? Porque é que, contra as
recomendações do Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC), quase metade do
valor dos contratos públicos continua a ser feito por ajuste directo, sem
concurso? Porque é que o município está em 117º lugar no ranking da transparência municipal e caiu duas posições no último
ano? Porque é que a comparação é sempre feita com os piores e não com os
melhores?
Aprendi
um dia que “a ética é a estética do comportamento humano” e, se há coisa essencial
que se deve apreciar, é uma sociedade bonita, onde as pessoas se respeitam, se
valorizam, se apoiam e desenvolvem mutuamente. Quem aprecia tal modelo ético de
sociedade, não pode gostar de sectarismo, amiguismo e favoritismo, nem de tráfico
de influências, corrupção e opacidade. Porque estes são comportamentos feios,
tal como é feia a incompetência, o esbanjamento de dinheiro público e a impunidade.
Falar de ética é falar de responsabilidade, da que se tem para com os outros e
para consigo próprio, pois nada tem valor nem merece aprovação, nada deve
contentar nem servir de justificação, se não for ético. Não cuidar devidamente
das pessoas e das infraestruturas, não escutar opiniões diferentes e não
valorizar o que elas têm de positivo, não revelar o que se faz e não defender o
interesse e bem comum, não é ético. Ético é aquilo que é justo, que promove o
bem comum e que a razão aprova, seja nas grandes acções ou nos pequenos actos
da vida. Ético é o que o comportamento demonstra, não o que se arroga ou apregoa.
José
Rafael Nascimento
jn.correio@gmail.com(Publicado na Gazeta das Caldas de 26 de Junho de 2015)
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